terça-feira, 8 de outubro de 2013

Essential Killing

Um homem, talvez afegão, interpretado por Vincent Gallo é apanhado pelo exército americano em um deserto não especificado, talvez Afeganistão, após ter assassinado 3 soldados americanos sem misericórdia, e é levado como prisioneiro de guerra para um país da Europa oriental (daqueles que fecham os olhos aos direitos humanos). Ele sofre tortura, mas nada fala e assim prossegue durante todo o filme.

Devido a um acaso, consegue fugir e o filme é isso: a fuga de um homem por uma paisagem cheia de neve, impiedosa, inóspita, quase desabitada. Além do frio e do exército que o persegue, o fugitivo tem que lutar contra a fome e contra quem se lhe atravessa, não hesitando em ir deixando um rastro de sangue pelo caminho, matando de forma essencial - daí o nome do filme.

Vale destacar uma imagem de Gallo buscando o leite de uma mãe, a qual é polêmica e filmada com coragem. E mesmo quando, quase já morto, é encontrado por uma pessoa, entretanto muda, intensificando ainda mais o silêncio.

Não obstante a premissa politica, ‘Essential Killing’ é muito mais um filme de ‘ambiente’, até de suspense , do que de argumento. E muito menos de ‘diálogos’: Gallo não tem uma única fala durante todo o filme, o que não impediu que trouxesse o prémio para o melhor ator do Festival de Veneza de 2011. E Skolimowski trouxe o prémio especial do júri (presidido por Tarantino) para este filme minimalista, mas expressivo e visualmente marcante.

Um grande filme que estreou em São Paulo somente no Cine Olido e já não está mais em cartaz. Uma boa alternativa é buscar via torrent.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Perdão, Leonard Peacock - Matthew Quick

O novo livro de Matthew Quick, “Perdão, Leonard Peacock”, foi lançado em setembro pela Editora Intrínseca. Foi o terceiro livro no Kindle que li, após os dois de Nick Hornby (Alta Fidelidade e Febre de Bola), sobre os quais falarei um pouco depois.

Bem, Quick ficou mundialmente conhecido após a adaptação para o cinema do seu livro “O Lado Bom da Vida”, um livro, digamos, ruim. O filme concorreu a oito prêmios no Oscar, sendo que Jennifer Lawrence ganhou o Oscar de Melhor Atriz e se consagrou definitivamente como a nova "queridinha" de Hollywood (não concordo com a premiação, até porque ninguém que concorra com Emmanuele Rivas - de "Amor" - poderia ganhar).

O personagem que leva o nome do livro, Leonard Peacock, é um rapaz atormentado pelo passado e com segredos profundos e dolorosos. Ele também é o narrador da história, e logo no começo te conta que vai matar o ex-melhor amigo e se matar logo depois com uma arma herdada de seu avô.

Quick tem uma maneira fluida de escrever o texto, o que torna fácil a leitura, muito embora fique realmente entediante às vezes, pois, pelo menos pra mim, parece que Quick gosta de prolongar pensamentos, de forma a tentar dar um ar mais dramático aos mesmos. Não consegue.

O que podemos contar - e que realmente é interessante - é que o autor faz uma dura crítica aos valores dos jovens, cada vez mais consumistas e individualistas e como é difícil ser diferente em uma sociedade em que todos querem ser apenas iguais. “Vocês todos estão usando mais ou menos o mesmo tipo de roupa. Olhem ao redor e verão que é verdade. Agora, imagine que você é o único que não usa uma marca legal. Como isso faz você se sentir? O raio da Nike, as três listras da Adidas, o jogadorzinho de polo em cima do cavalo, a gaivota da Hollister…”, discute uma parte do livro.

O personagem central tem uma perspectiva crítica e irônica sobre aqueles que o cercam. Outro ponto (des)importante do livro são as constantes notas de rodapé, presentes em quase todas as páginas e que, pelo menos uma boa parte delas, poderia ter sido removida. Nelas o personagem faz seus comentários sagazes, ou meramente tolos, das pessoas e situações e também narra acontecimentos passados.

Como dito acima, o livro destila algumas discussões bacanas, quase sempre protagonizadas pelo professor de Leonard, Herr Silverman, mas na maioria das vezes derrapa na obviedade.

domingo, 1 de setembro de 2013

Bling Ring ou "o retrato da juventude entediada"

Hoje finalmente fui assistir Bling Ring, novo filme de Sofia Coppola. Fui no Playarte Bristol do Center 3, na boa sala 2 do complexo. Paguei R$ 24 por duas meia entradas - sim, acho caro, mas como não encontrava um torrent confiável.... - e gostei muito do que vi!

A juventude meio perdida e entediada, que marca a temática de todos os filmes de Sofia - Virgens Suicidas, Encontros e Desencontros, Maria Antonia, Um Lugar Qualquer - não se deixa escapar em Bling Ring. Na verdade, acho que é neste que a sua visão da atual juventude se expressa com afinco e com absurda e infeliz realidade.

O filme é sobre um grupo de jovens que roubaram casas de celebridades nos EUA - sim, caso real. Paris Hilton, Megan Fox e Lindsay Lohan foram algumas das vítimas. Faziam isso pelo delírio consumista, por se sentirem melhores quando possuiam as melhores marcas e quando conseguiam muito dinheiro. Acima de tudo, faziam isso para se alçarem a um status semelhante ao de suas celebridades preferidas. Junto com as bolsas Louis Vuitton, Chanel, etc., o consumo de drogas e álcool vêm junto como "brinde", tornando o caos já estabelecido em algo cada vez pior.

Sofia nos mostra o vazio extenuante e sufocante da geração touch, em que tudo vem e vai muito rápido, em que não se há mais muito valor nas vivência entre as pessoas, mas tão somente no consumo e ostentação, além da busca por milhares "curtir" e "retweet" no Facebook e Twitter, respectivamente. O tédio é frequente, justamente porque o objetivo é sempre mais, materialmente falando. 

E sabemos que, com relação a esse pensamento norteador, os jovens americanos não são muito diferentes dos muitos jovens brasileiros que cantam com louvor as músicas do "funk ostentação", onde o mais relevante é cada vez mais "ter" do que "ser", pois, afinal, hoje em dia você só é algo se você tem alguma coisa - o efeito rotulador é enlouquecedor, pois parecemos meros produtos que devem ser etiquetados para preencher o vazio de uma prateleira, para que, enfim, possamos ser escolhidos e aceitos pelos outros. Triste.

Enfim, o filme é regularmente construído, mostrando o surgimento e declínio do grupo. Um filme importante pra todos, especialmente para os minimalistas e educadores, para que possamos identificar e buscar meios de lidar com esse grande mal.



terça-feira, 27 de agosto de 2013

Ciné-Club (Reserva Cultural) / Você é tão bonito (Je vous trouve très beau)

Bem, aqui vai mais uma dica pra quem quer aproveitar o prazer de se ir ao cinema gastando pouco.

Sempre no último domingo de cada mês, a Reserva Cultural, em associação com a Aliança Francesa, apresenta o Ciné-Club, sempre com um filme francês. Por R$6,00 o ingresso, que você pode adquirir a partir da quinta-feira anterior ao último domingo, você tem o ticketpara o filme e leva, ainda, um café da manhã (croissant, pain au chocolate, suco e café).

Eu vou desde que o Ciné-Club foi implantado e acho uma ótima iniciativa para difusão do cinema francês aqui no Brasil e, de quebra, tomar um bom café da manhã a baixo custo.

No último domingo, o filme escolhido foi "Você é tão bonito", da diretora Isabelle Mergault. Uma ótima comédia sobre como os opostos podem se atrair.

Além disso, o filme mostra seus personagens como pessoas do campo e, portanto, desconectadas da internet, etc., e que se divertem tanto sem todo o aparato tecnológico.

Na história, Aymé Pigrenet (Michel Blanc) é um fazendeiro viúvo, que ao procurar por uma esposa numa agência de matrimônio recebe a sugestão de ir à Romenia. O motivo é que lá há muitas mulheres que sonham em se casar com um francês, para melhorar de vida. Aymé apenas precisa de alguém que possa ajudá-lo a manter a fazenda em perfeito funcionamento. Ao chegar ao país ele conhece uma bela jovem, Elena (Medeea Marinescu), cujas "experiências" não são exatamente as que ele almejava.

O cinema francês realmente mostra a Hollywood que não é preciso ir muito longe pra fazer humor de ótima qualidade.


Frances Ha



Depois de muito garimpar pela internet e não descobrir nenhuma fonte confiável de torrent para assistir o filme "Frances Ha", de Noah Baumbach, decidimos ir vê-lo no cinema. Primeiro, fomos ao Reserva Cultura - ingressos praticamente esgotados. Depois, na Livraria Cultura, o mesmo se repetiu. Nossa última tentativa foi o Espaço Unibanco (recuso-me a chamá-lo de Espaço Itaú) do Shopping Frei Caneca. Ingressos escassos nos impossibilitaram de assistir o filme em nossas poltronas favoritas, mas tudo bem.


Vamos ao cinema uma vez por semana- sem contar sessões gratuitas e a preços bem baixos (por ex. Cinesesc e CCSP). É uma paixão. Justamente por isso, não nos incomodamos em gastar dinheiro com isso. A bem da verdade, não considero um mero gasto, mas sim um investimento intelectual.

Pois bem, Frances Ha é um bom filme, embora conte com a mesma-atuação-de-sempre de Greta Gerwig, o que não é ruim, mas também não é algo que se destaque muito. Trabalhando com o marido, Noah Baumbech, ela está se transformando numa espécie de musa indie do cinema, tendo protagonizado filmes como "Lola Versus" e "Greenberg", dentre outros.

O filme em si mostra a jornada de Frances, que quer se dançarina, embora não tenha o talento necessário pra isso. Próxima dos 30 anos, ela se vê em um mundo sem muitas perspectivas tanto profissionais quanto amorosas, e, muito por conta disso, aproveita ao máximo as boas notícias que recebe - destaco a cena em que ela sai correndo pela rua ao som de Modern Love do David Bowie.

A fotografia em preto e branco é linda, ainda mais quando o cenário muda para Paris, assim como a trilha sonora bem interessante!

Confiram!


quinta-feira, 15 de agosto de 2013

A atitude minimalista

Bem, já faz alguns meses que eu e a Camila resolvemos adotar um outro estilo de vida. Buscando sistematicamente reduzir nosso consumo, em prol de uma vida mais sustentável, mais feliz, com mais tempo para fazermos o que quisermos e com menos obrigações orientadas tão somente a ganhar mais dinheiro para comprar coisas que não precisamos.

Vislumbramos que nossas vidas se completam com não muitas coisas/atividades externas, tais como filmes, livros, música, teatro. arte e viagens. Chegamos à conclusão de que nos sentimos completos quando fazemos qualquer uma dessas atividades e não quando compramos um novo par de tênis ou roupas.

O problema é que sempre somos bombardeados por todos os meios de mídia de que devemos consumir, consumir desesperadamente e manter todos os nossos gadgets, roupas, etc. atualizados ou, caso contrário, estaríamos ultrapassados. 

Isso não é nem de longe a verdade.

O que nos completa são as experiências que adquirimos, não as coisas que compramos.

Para completar, a partir do momento que eu e ela tomamos consciência disso, de que é possível sim ter uma vida mais auto-sustentável, sem termos que ficar sempre jogando o jogo capitalista e buscando adotar o american way of life, descobrimos também que isso nos ajuda a prestar mais atenção em nossa saúde, nas pessoas à nossa volta, ao meio-ambiente e na prática do desapego às coisas.

Então, a partir de agora, a proposta do blog passa a ser o de continuar a compartilhar minhas experiências com os filmes e peças que vi, livros que li, viagens, etc., mas sempre tentando dar dicas de como se incluir culturalmente em uma metrópole como São Paulo sem gastar muito ou nada!

quarta-feira, 31 de julho de 2013

Marina Abramovic - The Artist is Present

Destemida e provocadora, Marina Abramovic tem redefinido o significado da arte há quase 40 anos. Fazendo uso do seu corpo enquanto veículo, desafiando os seus próprios limites – e por vezes arriscando a sua vida no processo –, ela cria performances que nos desafiam, chocam e comovem. 

Marina Abramovic: the Artist Is Present segue a artista nos preparativos do que pode ser o momento mais importante da sua vida: uma grande retrospectiva no Museum of Modern Art. 

Ter uma retrospectiva num dos mais importantes museus do mundo é das mais elevadas formas de reconhecimento. Mas, para Marina, é bem mais do que isso, é a oportunidade para, de uma vez por todas, calar a questão que ela tem ouvido repetidas vezes nas últimas quatro décadas: “Mas por que isto é arte?"

A arte contemporânea produzida por Marina é chocante, com muito uso do nu e da violência. Mas, mais do que mostrar a sua arte, o grande ponto positivo do filme é mostrar a pessoa por traz da artista, seu passado, seu presente, seus temores, seus anseios. Mesmo quem duvida se é arte ou não o que Marina produz, é impossível não notar seu impacto psicológico. 

E o filme é uma arte por trás de toda a arte maluca de Abramovic. Imperdível!


Hannah Arendt

Margarethe Von Trotta, ao lado, mais uma vez, de Barbara Sukowa, intérprete habitual de seus filmes, como os premiados "Rosa Luxemburgo"  e "Os Anos de Chumbo" se propôs ao desafio de retratar uma das pensadoras políticas mais importantes e influentes do século 20, autora de clássicos como "As Origens do Totalitarismo", Hannah Arendt.


Sem recorrer a um excesso de teorias, o roteiro escolhe como foco um episódio crucial na vida de Hannah. Em 1961, a filosofa alemã, já radicada nos EUA, viaja a Israel para acompanhar um dos julgamentos mais bombásticos de todos os tempos, do carrasco nazista Adolf Eichmann, capturado pelo serviço secreto israelense na Argentina. Seria ele um dos grandes culpados do nazismo ou simplesmente um cumpridor de ordens, um burocrata? Aqui nasce a fonte da tese de Hannah sobre a banalidade do mal.

Bem se nota que o nazismo está no centro das discussões, mas não somente ele. Há também o supostos envolvimento de autoridades judias com o nazismo - tema muito polêmico, mas inevitavelmente discutível. 

Há também, de forma menos lembrada, a questão de seu relacionamento com o mestre e ex-amante Martin Heidegger (Klaus Pohl), filósofo que se filiou ao Partido Nazista em 1933 e nunca se retratou da atitude após o fim da Segunda Guerra - para desgosto de Hannah, que era judia alemã e fugiu do país natal após a ascensão de Hitler ao poder.

Enxergando em Eichmann apenas um burocrata medíocre, como dito acima, cumpridor cego de ordens, recusando-se a ver um monstro de índole diabólica, e não se omitindo em apontar o que considerava como cumplicidade dos chamados Conselhos Judaicos na destruição de sua própria comunidade, Hannah atraiu a fúria dos próprios amigos e dos círculos judaicos. Muitos nunca a perdoaram pela ousadia. Para eles, ela estaria "defendendo" o carrasco, o que sempre negou.

Nada disso abalou a filosofa, que publicou seus artigos na "The New Yorker" - onde também sofreu pressões - e, dois anos depois, um livro que teve grande repercussão, "Eichmann em Jerusalém". 

O filme ressalta a coragem de Hannah que, apoiada por amigos como a escritora Mary McCarthy (Janet McTeer), resistiu, mantendo sua independência de pensamento, ainda que a um alto custo pessoal. 



Sem esgotar a discussão, mas, pelo contrário, alimentando-a para poder gerar posteriores discussões, o filme é, com certeza, um excelente meio de se envolver com a genialidade de Hannah Arendt e tomar partido de seus estudos e pensamentos.


Homem de Aço (Man of Steel)

A maioria dos filmes de super herói de hoje em dia escolhem o caminho psicológico de abordagem do personagem principal. Foi assim com Batman - com a quase perfeição atingida em Dark Knight -, um pouco menos com Iron Man e, agora, muito com O Homem de Aço, dirigido por Zack Snyder, um dos diretores mais renomados atualmente, muito por conta de seu trabalho estética e visualmente deslumbrante em 300.

Ao eliminar a famosa "cueca" vermelha (e cômica) do super-homem, o filme revela o seu anseio de se desprender de seus antecessores bem sucedidos. E tenta, de toda maneira, desvincular o Clark de Christopher Reeve pelo de Henry Cavill. O ator, importante destacar, mostra seu valor e não decepciona em nenhum momento, embora, é claro, não conte com o carisma inigualável de Reeve.

A película retrata a completa jornada do herói, com o bullying sofrido quando criança pelo jovem Clark, o passado mal explicado, a solidão de ser um "anormal" e o reencontro com a verdade, acompanhada de doses colossais e exageradas de lutas intermináveis contra um vilão muito bem construído por Michael Shannon - até mesmo mais ambíguo do que o protagonista.

Muito embora haja o excesso já citado das lutas do final, o filme é muito bom, com um roteiro bem idealizado. Diante dos inúmeros blockbusters lançados no ano, Man of Steel se destaca.


terça-feira, 9 de julho de 2013

Branca de Neve (Blancanieves)

Em 1920, na Espanha, Carmen (Macarena García) viveu parte de sua vida com sua terrível madrasta, Encarna (Maribel Verdú). Cansada de ser reprimida, a jovem resolve fugir de casa para viver diversas aventuras como toureira, na intenção de apagar seu passado traumático. Durante a viagem, ela recebe a ajuda de seis anões toureiros, que decidem protegê-la a todo custo.

O filme é excelente! Sim, é mudo e em preto e branco, mas convenhamos que filmes assim ainda nos cativam muito - vide "O Artista". Parece-me que os filmes mudos acabam buscando muito mais a linguagem cinematográfica plena, em vez de focar numa verborragia indiscriminada, sem limites (claro que Woody Allen é um caso a parte - sempre fui seu fã e adoro todos os seus filmes, com raríssimas exceções).

Blancanieves, dirigido por Pablo Berger (de Torremolinos 73 é uma releitura da obra clássica dos Irmãos Grimm, colocando a protagonista no âmbito das touradas espanholas, mas nada soa forçado. Maribel Verdú faz, talvez, a melhor "Bruxa Má" de todas, em atuação fascinante. Isso sem contar a fotografia e trilha sonora maravilhosas!

Um grande filme, que demorou cerca de oito anos pra ser concretizado e levou 10 prêmios Goya (o "Oscar" espanhol), inclusive o de melhor filme.


domingo, 7 de julho de 2013

A bela que dorme (Bella addormentata)

Dirigido e co-escrito pelo italiano Marco Bellocchio (de Vincere e Bom Dia, Noite), o filme retrata a história de diversas pessoas entrelaçadas pela morte de Eluana Englaro, evento real de uma garota que passou dezessete anos em estado vegetativo, até lhe ser concedido o direito à eutanásia, por conta da luta de seu pai.

Entretanto, Bellocchio afasta-se, de certa maneira, dos acontecimentos reais, usando-os como pretexto e pano de fundo para ficcionalizar e falar do que lhe interessa. Ou seja, de como o institucional (religião, política, etc.) pesa sobre a vida pessoal e vice-versa, em prejuízo da liberdade de pensamento e ação.

Há o senador que teve que lidar com a situação de desligar os aparelhos que mantinham viva a sua mulher, e que deverá votar sobre um projeto que delimita a liberdade de escolha dos familiares pela manutenção ou não de pessoas em estado vegetativo.

Há também o caso da mãe, vivida por Isabelle Huppert, que abdica da sua carreira de atriz para cuidar da filha em coma aparentemente não solucionável, bem como da mulher drogada que tenta por diversas vezes o suicídio, sempre impedida de alguma forma.

O filme, por vezes, se mostra um pouco confuso, muito por conta da variedade de situações e personagens.

Entretanto, na Mostra Internacional de São Paulo em 2012, Bellocchio venceu o prêmio de melhor filme para o júri de críticos. Em Veneza, foi premiado como revelação o ator Fabrizio Falco, que interpreta o irmão do militante Roberto, que tem problemas psicológicos e atormenta a rotina de sua família.


quinta-feira, 4 de julho de 2013

Augustine

Olha, assistir um filme não muito bom com o Vincent Lindon (um dos meus atores favoritos) é um achado bem indigesto.

Augustine, o primeiro longa-metragem da diretora Alice Winocour, conta ainda com a presença de Chiara Mastroianni (mulher de Lindon tanto no filme como na vida real) e da cantora Sako. É um filme sobre os impactos do estudo da histeria na sociedade francesa do século XIX liderado pelo Professor Charcot (Lindon), especialmente com relação aos distúrbios apresentados por Augustine (Sako), a qual começa a apresentar crises violentas que ocasionam até mesmo na paralisação de partes do seu corpo.

Porém, até qual momento a realidade se torna uma farsa, e o distúrbio patológico um jogo de sedução e de desejo?

O tema ainda é interessante, embora já esteja um pouco batido, principalmente por conta da realização de filmes como "Um método perigoso", de David Cronenberg. Entretanto, um dos principais pontos negativos do longa é a sua falta de ritmo, bem como a inexpressividade da atriz Sako. Como Chiara faz apenas alguns pontas, é bem difícil para Lindon segurar o filme sozinho. Infelizmente.


quarta-feira, 3 de julho de 2013

Os amantes passageiros (Los amantes pasajeros)

Como já muito se disse, "Os amantes passageiros" é, talvez, o pior filme do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, o que, digamos, é uma surpresa, haja vista que esse grande erro cinematográfico surge no momento de maturidade de sua obra. Como Pedro conseguiu realizar grandes obras como "Volver", "Abraços Partidos" e "A pele que habito", sem falar dos excepcionais "Fale com Ela" e "Tudo sobre minha mãe", e agora descambar para essa chanchada horrível?


Almodóvar usa aqui um trio de protagonistas como centro de referência de um painel mais amplo. Javier Cámara, Carlos Aceres e Raúl Arévalo são os comissários de bordo de um voo entre Madri e a Cidade do México, que precisa fazer um pouso forçado devido a um problema técnico causado na primeira parte da trama - e, talvez, a única que se salva de todo o filme, em que participam de forma relâmpago os atores almodovarianos por excelência: Penélope Cruz e Antonio Banderas. 

A situação extrema motiva confissões dos passageiros da primeira classe, tentativa de fazer emergir do caos uma nota irônica sobre a sociedade contemporânea, espanhola em particular.

Sempre há transgressão nos temas propostos por Almodóvar, mas no caso de "Os amantes ...", essa transgressão fica limitada a uma tentativa tosca de desmistificação do sexo, em particular dos homossexuais, totalmente estereotipados - teria Almodóvar visto os filmes dirigidos pela Julie Delpy ultimamente?

Enfim, Os Amantes Passageiros podia ser um retorno bem-sucedido de Almodóvar às origens (vale lembrar que o pouso forçado se dá na região de Castilla-La Mancha, onde o cineasta nasceu), porém o filme não se encontra em nenhum momento e seus pouco mais de 80 minutos tornam-se enfadonhos e difíceis de aguentar.


Guerra Mundial Z (World War Z)


Guerra Mundial Z volta com o tema dos zumbis, os quais nos bombardeiam aos montes nos filmes e seriados. Mas será que traz uma nova perspectiva? Uma nova abordagem? Um novo desafio?


Eis a storyline: uma terrível e misteriosa doença se espalha pelo mundo, transformando as pessoas em uma espécie de zumbis. A velocidade do contágio é impressionante e logo o Governo americano recruta um ex-investigador da ONU para investigar o que pode estar acontecendo e assim salvar a humanidade, tendo em vista que as previsões são as mais catastróficas possíveis. Gerry Lane (Brad Pitt) tinha optado por dedicar mais tempo a sua esposa Karen (Mireille Enos) e as filhas, mas seu amor a pátria e o desejo de salvar sua família acabam contribuindo para que ele tope a missão. Agora, ele precisa percorrer o caminho inverso da contaminação para tentar entender as causas ou, ao menos, identificar uma maneira de conter o contágio até que se descubra uma cura antes do apocalipse. Começa uma verdadeira corrida contra o tempo, que mostra-se cada vez mais curto, na medida que a população de humanos não para de diminuir.


Com cerca de 115 minutos, fiquei com a sensação de que o filme poderia ter ido um pouco mais além. Ele começar muito bem, com um ritmo frenético e movimentos de câmera incessantes, além da trilha sonora quase claustrofóbica do Muse. Brad Pitt, embora em um papel que exija menos talento do que o que ele realmente tem, não decepciona - embora eu ainda ache que Pitt tenha se desvirtuado do ótimo caminho que ele vinha traçando com Fight Club, Snatch, etc.

Mesmo com ótimos efeitos visuais,  o filme em si não justifica tanto o fato de ser o filme de zumbis mais caro de todos os tempos. Ok, não tivemos filmes espetaculares de zumbis, mas enfim. Além disso, muito desses milhões gastos vêm do fato de mais de quarenta minutos do filme terem sido regravados em virtude de inconsistências no final. Gostaria muito de ver essa justificativa em extras do Blu-ray, além das "brigas" entre Pitt e o diretor Marc Forster (claro que isso será quase impossível de aparecer, infelizmente).

De qualquer forma, pela deixa do final, é bem possível que teremos uma sequência. É esperar pra ver.


segunda-feira, 1 de julho de 2013

Farrapo Humano (Lost Weekend) e Smashed


A comparação é tão somente por conta das histórias similares: o alcoolismo e seus efeitos devastadores.

Pois bem, "Farrapo Humano", de Billy Wilder, é um grande clássico do cinema, e opta por fazer uma desconstrução do personagem principal - Don Birman -, um escritor em crise, sem ideias para seu livro e, tampouco, com projeções para a sua vida, além do próximo copo de whisky. Porém, em um final de semana, ele terá de se confrontar com seus demônios e descer até o fundo do seu vício.

O filme retrata muito bem o desmoronamento moral do protagonista, com sua incessante incapacidade de se livrar do vício, suas recaídas, etc. Além de tudo isso, a construção do mise-en-scène é fenomenal: a música perturbadora, além da expressão sempre caótica do personagem nos fazem afundar em sua degradação.

Por outro lado, "Smashed", ainda inédito no Brasil, dirigido por James Ponsoldt e protagonizado por Mary Elizabeth Winstead, mostra, em três atos, o vício da personagem principal (Kate) pelo álcool. Ela é casada com Charlie, também alcoólatra. Ao ver do casal, tudo parece decorrer de forma "normal" até que Kate vomita na sala onde ministra aulas para crianças, em virtude da sua ressaca. Inventa mentiras. Entretanto, buscando um pouco de refúgio, começa a ir em um grupo de AA sugerido por um colega do trabalho.

Esse segundo ato, da luta da protagonista contra o alcoolismo, é muito superficial, entretanto. Muito embora ela ainda more com Charlie, que continua com o seu vício, Kate só tem uma recaída, por conta de um fato específico e não por conta do caos da falta do álcool em seu corpo na rotina do dia a dia. O terceiro e derradeiro ato mostra como o vício corrói o relacionamento dos personagens.

Assim, se "Farrapo Humano" é essencial, obrigatório, "Smashed" é apenas mais uma opção.


Farrapo Humano


Smashed


domingo, 30 de junho de 2013

A Espuma dos Dias (L'écume des jours)

Baseado no livro de Boris Vian, o filme de Michel Gondry, com elenco francês, contando com Romain Duris, Omar Sy e Audrey Tautou, se perde no impressionismo exagerado que toma o lugar da história, muito bonita por sinal: 

Colin (Romain Duris) é um homem rico e despreocupado, que nunca precisou trabalhar. Tímido, ele nunca teve muito sucesso com as mulheres, até ser apresentado a Chloé (Audrey Tautou) durante uma festa. Apesar de um primeiro encontro desastroso, os dois se apaixonam e se casam. O casal está sempre cercado pelos amigos Nicolas (Omar Sy), um cozinheiro talentoso, Chick (Gad Elmaleh), um intelectual pobre e fascinado pelo filósofo Jean Sol-Partre (!!!), e a extrovertida Alise (Aïssa Maïga). Tudo caminha bem, até o dia em que Chloé é diagnosticada com uma doença rara: ela tem uma flor de lótus crescendo dentro do seu pulmão. O caríssimo tratamento exige o uso de diversos medicamentos e a aplicação de centenas de flores, levando Colin à falência, e a amizade do grupo à crise.

Embora dê o entendimento de que o filme vai no mesmo caminho do excepcional "Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças", "A espuma dos dias" se desvirtua, se perde no caminho de seus delírios surreais e, por isso, é uma das maiores decepções do ano, infelizmente.


segunda-feira, 24 de junho de 2013

Aqueles que ficaram (Ceux qui restent)


Os Cine Clubes nos proporcionam ótimas oportunidades de conferir filmes que não estrearam por aqui em grande circuito. "Aqueles que ficaram" é um ótimo exemplo.

Assisti esse filme em 2010, salvo engano, em uma Mostra do então Espaço Unibanco da Augusta, referente a novas diretoras francesas  e tive a oportunidade de revê-lo no Cine Clube da Reserva Cultural, em parceria com a Aliança Francesa. 

A diretora, Anne Le Ny, é muito mais conhecida pelos seus trabalhos como atriz (destaco aqui "Intocáveis" e "A Guerra está declarada"), porém realiza um ótimo trabalho de direção em "Aqueles que ficaram" - seu primeiro, é bom destacar, além de marcar presença como a irmã do protagonista Bertrand, vivido pelo magistral Vincent Lindon.

Emmanuelle Devos também está impecável no papel de Lorraine, que ao lado de Bertrand, sofre por ter um ente querido com câncer. É uma película muito delicada que busca trazer a tona o sofrimento daqueles que tem que acompanhar o  lento sofrimento e degradação de alguém tão próximo. 

Como abrir mão de sua própria vida para cuidar de alguém? Essa e muita obras perguntas são ressaltadas nesse excelente filme.


segunda-feira, 17 de junho de 2013

Antes da Meia-Noite (Before Midnight)


O terceiro e talvez último filme (rezemos que não!) relativo à vida dos amantes Jesse (Ethan Hawke) e Celine (Julie Delpy) não poderia ser tão bem acabado. Se no primeiro (Antes do Amanhecer), a dupla se encontra por acaso na Europa, se apaixonam, mas acabam seguindo caminhos diferentes após uma noite em Viena, em virtude de ele morar nos Estados Unidos e ela na França, no segundo (Antes do Pôr-do-Sol), Jesse e Celine estão nove anos mais velhos, na casa de seus trinta anos, e acabam se encontrando em Paris, selando seu amor, conforme depreendemos em "Antes da Meia-Noite", que se passa nove anos mais tarde, dezoito anos depois do primeiro encontro no trem.

Bom que se saiba que o todo esse tempo decorrido na história deles é "real". Explico: o primeiro filme foi lançado em 1995, o segundo em 2004 e o terceiro em 2013.

Bem, Jesse e Celine estão juntos e têm duas lindas filhas. Ele, um escritor bem sucedido, dividido entre sua família em Paris e seu filho do casamento anterior, que mora em Chicago. Ela, uma defensora do meio ambiente, envolvida com uma nova proposta de emprego.

O filme busca mostrar sua relação, seus conflitos, abordando assuntos típicos de quem está na casa dos quarenta anos, em um relacionamento estável e com filhos. Os diálogos incessantes e intensos tem agora lugar na Grécia, uma das grandes vítimas da crise econômica que assolou o mundo, porém palco também do nascimento da filosofia, da discussão e da busca de conhecimento.

Como disse, um grande filme, com atuações e  direção (de Richard Linklater) muito seguras. O roteiro assinado por Ethan Hawke, Julie Delpy e Richard Linklater deixa transparecer as suas angústias com sacadas inteligentíssimas. Costumo qualificar essa trilogia como sendo a "Trilogia da Vida", pois, envolto ao amor e à relação dos dois, nos vemos bombardeados por muitos questionamentos que fazemos em nossas próprias vidas, nos aproximando muito daqueles dois personagens.

Para ver e rever sempre!

sábado, 15 de junho de 2013

A vida privada das árvores - Alejandro Zambra

Fonte: http://www.livrosabertos.com.br

Tal como ocorre em Bonsai, em A vida privada das árvores as plantas constituem, mais do que belos elementos de cenário, metáforas fundamentais para a compreensão do enredo. Se no primeiro livro um bonsai simboliza tanto uma relação amorosa quanto uma das possíveis maneiras de pensar e escrever ficção, aqui, neste segundo romance de Alejandro Zambra, o álamo e o baobá, personagens de histórias contadas a uma criança, aludem à passividade, à imobilidade e à sensação de permanência.

É possível questionar se Julián, o protagonista de A vida privada das árvores, não seria o autor fictício de Bonsai. Professor de literatura e escritor, Julián confessa a amigos que “se alguém lhe pedisse para resumir seu livro [sobre o qual se debruça, e que depois finalmente conclui], provavelmente responderia que se trata de um homem jovem que se dedica a cuidar de um bonsai”. O romance que Julián conclui é minúsculo, assim comoBonsai. Julián não se chamou Julio por um erro do oficial do registro civil — e Julio é o nome dado ao protagonista de Bonsai.

Outra semelhança entre os dois primeiros livros de Zambra — o terceiro, ainda não traduzido e publicado no Brasil, chama-se Formas de volver a casa — está na temática. Quem não vê com bons olhos a literatura que se ocupa da literatura deve fugir de ambos. As relações amorosas, vínculos normalmente frágeis para o autor chileno, ganham novo trato. O tempo e nossa forma de senti-lo, a solidão e a mediocridade — ou impossibilidade, ou vazio — da vida frente à ficção são outros conceitos revisitados em A vida privada das árvores.

Verónica, mulher de Julián, não volta para casa após a aula de desenho. O narrador avisa que “o livro segue em frente até ela voltar ou até Julián ter certeza de que ela não voltará mais”. O nervosismo do protagonista aumenta na medida em que as horas passam e a madrugada avança sem que haja sinal de Verónica. Durante a espera aflita, em duas ocasiões Julián conta histórias para fazer Daniela, sua enteada de oito anos, dormir. O conteúdo das narrativas é o mesmo: a vida do baobá e do álamo, árvores que, estando lado a lado, trocam confidências entre si. É este tempo que se encontra suspenso — o que dura a expectativa, a dúvida, a angústia — o presente do romance.

O passado também está lá, e toma a forma das lembranças de Julián: seu antigo relacionamento com Karla, que terminou com o afastamento do casal; o primeiro casamento de Verónica, com o pai de Daniela, que durou três meses; sua infância mais ou menos tranquila, sem grandes alegrias nem tragédias. O futuro também é vislumbrado: decidido a ignorar o presente aflitivo, a escapar da ansiosa espera pelo retorno da mulher, Julián imagina a enteada já adulta. 

Há um enorme e real vazio em A vida privada das árvores: caminhos que não seguiram e não seguem o curso planejado ou esperado, personagens que não são capazes de recordar com exatidão a própria trajetória — que não veem, ou não querem ver, uma ligação óbvia entre passado e presente —, relacionamentos insatisfatórios e frágeis que não trazem alívio para solidão. É de uma realidade rotineira e medíocre de que se ocupa a ficção de Alejandro Zambra, e é justamente aí que está o seu mérito. Tudo em Zambra, seja em Bonsai ou em A vida privada das árvores, é comum, possível, banal. Enquanto, assim como o álamo e o baobá, Julián talvez esperasse fincar raízes e permanecer ao lado de alguém, fosse em uma relação de amor ou amizade, ele parece condenado à insatisfação e à busca constantes. Assim como a maioria das pessoas, Julián tem apenas uma característica em comum com as árvores: a imobilidade, a inércia, a capacidade de se mexer apenas pela mudança e pela força dos ventos.

“Seria preferível fechar o livro, fechar os livros, e enfrentar, sem mais, não a vida, que é muito grande, mas a frágil armadura do presente”, diz o narrador. Como poucos autores, contemporâneos ou não, Zambra soube pôr luz exatamente nas zonas em que a vida se assemelha e se diferencia da ficção — e, ao mesmo tempo em que a vê como uma tábua de salvação, também ressalta sua inutilidade. Seus dois primeiros livros são breves; a sensação de incômodo e desconcerto é que é persistente.

Golpe de Misericórdia - Marguerite Yourcenar

Golpe de Misericórdia é um curto romance que se desenrola na esteira da guerra de 1914 e da Revolução Russa. Escrito em 1938, inspirado numa ocorrência autêntica, o assunto do livro, segundo Yourcenar, está muito próximo de nós “porque a desordem moral que ele descreve permanece a mesma em que fomos e estamos cada vez mais mergulhados”. Este romance com fortes inclinações para a tragédia, desenvolve-se num lugarejo denominado Kratovice, um rincão obscuro dos países bálticos, isolado pela revolução e pela guerra. A historia de amor entre três protagonistas, “um quase puro conflito de paixões e de vontades”, é narrada na primeira pessoa, através de Éric Von Lhomond, personagem caracterizado pela lúcida rispidez, e o tema central é “antes de tudo a comunidade de espécie, a solidariedade de destino entre três seres submetidos as mesmas privações e aos mesmos perigos”.

Ótima dica!

Segredos de Sangue (Stoker)

Tive algumas expectativas com relação a "Segredos de Sangue", justamente por ser dirigido por Chan-wook Park, do fantástico e violento Oldboy. Toda a estética e estilo caracterizados neste filme em nada remete a Segredos, nessa primeira tentativa do diretor na indústria de Hollywood.

Mesmo com duas atrizes de muita qualidade (Nicole Kidman e Mia Wasikowska), o filme não engrena. O roteiro gira em torno da aparição do tio de India Stoker no enterro do irmão, pai de India. O tio até então desconhecido pede por um tempo com elas em sua casa, haja vista estar voltando de uma viagem pela Europa.

Segue-se com o envolvimento do tio do núcleo familiar alterado pela ausência do pai e a ocorrência de muitos eventos estranhos, os quais, somados, deveriam levar a uma catarse que, ao final, mostra-se muito insatisfatória. A estética da violência de Park respira em pouquíssimo momentos, os quais nem acabam se tornando tão impactantes ou memoráveis quanto os de Oldboy.

Em suma, uma experiência cinematográfica bem vaga.


sexta-feira, 14 de junho de 2013

O Grande Gatsby (2013)

Podem falar que é muita purpurina, que é muito kitsch, que vulgariza a história criada por F. Scott Fitzgerald. Nada irá alterar a minha percepção sobre o filme, o qual, em 3D ou 2D, tem muitas qualidades.

Além da interpretação impecável de Leonardo DiCaprio (mais uma) e as boas presenças de Carey Mulligan e Tobey Maguire, o filme inova e arrisca ao propor uma trilha sonora reinventada para o contexto da época. Sai o Jazz, entra o Rap e outras cerejas desse ótimo bolo (Florence + The Machine, Lana Del Rey e The xx).

Os figurinos são ótimos, além da fotografia quase impecável. Mesmo o início um pouco mais lento não é um ponto negativo, haja vista a necessidade desse prelúdio até a grande aparição de Gatsby. Baz Luhrmann volta a fazer um filme muito bom - sim, eu gostei bastante de Romeu + Julieta.


segunda-feira, 20 de maio de 2013

Os sabores do Palácio (Les saveurs du Palais)


O filme "Sabores do Palácio", dirigido por Christian Vincent, é baseado na história real da cozinheira do presidente francês François Mitterand, no Palais Elysee (Palácio do Governo). Hortense Laborie (Catherine Frot) é uma Chef pega de surpresa pelo convite para ser a cozinheira da principal comitiva do governo presidencial, após ter sido indicado por um famoso e renomado chef francês. Meio relutante, ela aceita o cargo.

A partir desse momento, uma série de omissões do roteiro enfraquecem a história do filme, haja vista que (i) poderia ter se dado uma importância mínima para a trajetória de Hortense antes do tão prestigiado convite, agregando, de certa forma, informações sobre o porquê de ter sido escolhida para a função, (ii) o roteiro poderia ter abordado a dificuldade que ela provavelmente teve com a utilização de todo um aparato tecnológico presente na cozinha que viria a trabalhar - considerando que, ao chegar ao seu posto no primeiro dia, desconhecia a maioria dos equipamentos lá presentes e sua forma de utilização, e (iii) ter utilizado uma história paralela, na qual a protagonista se encontra na Antártida, como Chef de cozinha da equipe francesa de pesquisadores lá presente.
Principalmente em virtude da escolha da história paralela, a história principal acaba perdendo em importância, profundidade e relevância, aliado ao fato da atriz Catherine Frot não demonstrar o carisma necessário para ensejar tanta adoração por onde passa - com exceção dos que trabalham na cozinha "secundária" do Palais Elysee, que a odeiam/invejam com voracidade.

Assim, e aliado ao fato da protagonista não dividir seu protagonismo no longa com os "sabores" do palácio, o filme se torna enfadonho e desinteressante em diversos momentos, salvo apenas quando contamos com a presença ilustre da comida originária da rica culinária francesa. Entretanto, a demonstração da burocracia presente no palácio - com o controle rígido de tudo o que se é feito -, além de todo o estresse que tal ofício (de Chef) origina, é um ponto positivo isolado, o qual, porém, não salva o filme.

domingo, 19 de maio de 2013

O 30º capítulo de Nadal x Federer



Final do Masters 1000 de Roma. Por ser a trigésima partida entre esses dois ícones do esporte – Roger Federer e Rafael Nadal, vale reportar mais esse capítulo na história do confronto de jogadores tão espetaculares. Entretanto, as estatísticas não sugerem um confronto parelho. Isso pois no saibro, contabilizam-se 12 vitórias para Nadal e 2 apenas para Federer. No geral, são 19 vitórias para Nadal e 10 para Federer.

Nadal, com 26 anos e 55 título de simples, é atual número 5 do mundo – tecnicamente, vez possa ser considerado o primeiro, pois perdeu muitas posições em decorrência de seu afastamento do circuito para tratar de seus problemas crônicas no joelho. Tem 23 títulos de Masters 1000, sendo o maior ganhador de torneio. Só em Roma foram 6 campeonatos.

Federer, por sua vez, com 31 anos e 76 títulos de simples, é considerado o melhor tenista da história – sim, ele foi, mas não é mais. Faz sua primeira final do ano. Atual número 3 do mundo. Tem 21 títulos de Masters e nunca foi campeão em Roma, tendo feito 3 finais, uma, inclusive, épica, contra Nadal em 2006, tendo perdido apenas no quinto set, após ter desperdiçado dois match-points.

Roger até agora não perdeu nenhum set na competição e teve jogos mais fáceis que Nadal. Será que está “babando” mesmo por esse título?

Dia de muito sol em Roma. Quadra Central. Nadal e seus tiques irritantes (ajuste da cueca, do cabelo e do nariz). O ace de Federer no primeiro ponto e o voleio do segundo sugerem um domínio do suíço? Primeiro game do Federer, com a ótima sugestão do saque e voleio, o que facilita muito o jogo para o Federer. Trocar bolas de fundo de quadra é suicídio frente a Nadal. Para quem acompanhou todos os 29 jogos entre os 2, sabe que Federer só tem chances contra o espanhol quando encaixa bem o voleio e drop shots.

Após confirmar seu serviço, Nadal consegue a quebra do saque de Federer com extrema facilidade no game seguinte, contando com um erro não forçado no break point. Incrível, mas se fosse com qualquer outro jogador, Federer teria tido, provavelmente, uma outra atitude em um ponto tão importante.

No game de “confirmação da quebra”, quatro erros do Federer e confirmação do serviço do Nadal, o que demonstra incrível instabilidade mental do suíço. A rede é sua principal inimiga, às vezes. Sabe que suas bolas tem que ser baixas e rápidas para diminuir o tempo de reação de Nadal, mas sua ansiedade e afobação o atrapalham muito. E quando suas bolas não param na rede, acabam sendo fundas demais e saem da quadra. Falta uma dosagem correta.

Já Nadal é um muro de concreto. Por ele nada passa e seu emocional é o mais forte da história do tênis. Suas bolas fundas no revés (esquerda) de Federer são o veneno que há anos funciona contra o suíço, sem que ele encontre muitas respostas concretas.

4-1 Nadal. 21 minutos de jogo, duas quebras e um set praticamente decidido. Nesse momento, com o seu jogo habitual, não há como Federer ganhar o jogo. Nadal criou uma zona de conforto intransponível por Roger, que sequer força algo diferente. Continua com erros não forçados, enquanto Nadal aposta sempre em seus balões de fundo de quadra para desestabilizar e, então, encaminhar o winner na jogada seguinte.

5-1 Nadal. 30-30, mais um erro não forçado de Federer. Set Point para o Nadal. Federer aposta em um voleio pífio, que vai longe. 6-1 para o Nadal em 23 minutos apenas. Muito mais por medo e ansiedade do que por uma surra, Federer perde o set de forma vergonhosa.

Com 15 erros não forçados de Federer, ele deu ao Nadal praticamente dois terços dos pontos ganhos pelo espanhol. Federer não insistiu no saque e voleio que lhe valeu o seu único game na partida até agora e isso tem sido uma péssima escolha.

Segundo set. 0-30 Federer. Bons ataques lhe renderam uma expectativa que foi abortada com um voleio mal executado e um erro na devolução. 30 iguais. Com o segundo erro não forçado de Nadal no game, surge a primeira chance de quebra de Federer no jogo, revertida com um ótimo saque aberto de Nadal, que sabe se livrar dessas situações como ninguém. Roger alterna poucos winners espetaculares com muitos erros pífios. Isso rende o game para Nadal, que controla tudo do funda da quadra com amplo domínio.

Onde estariam os drop shots e os voleios de Federer para fazerem o adversário sair da sua zona de conforto? Não existem.

14-40 para Nadal. Diferentemente de Federer, Rafael agarra suas chances com tudo que possui. Quebra o saque com uma pancada firme, contabilizando mais uma passada sensacional. 2-0 Nadal e o jogo vai se encaminhando para o fim, em um jogo totalmente apático de Federer.

Nadal faz 3-0, ganhando seu game de zero e três erros não forçados de Federer. Não temos sequer 40 minutos de jogo ainda.

No game seguinte, Federer, nitidamente envergonhado, melhora seu jogo para tentar evitar um pneu (6-0). Após muito tentar, conseguiu um game como muito esforço. Até agora, entretanto, Nadal ganhou o dobro de pontos de Federer no jogo.

Nadal conseguiu abrir 4-1, mesmo tendo cometido uma dupla falta e ter visto um approach esquisito, porém eficiente, de Federer, que resultou em seu smash. Porém, na sua última oportunidade de confirmação antes do iguais, Nadal conseguiu um excelente ponto, mostrando seu antídoto para uma nova investida em approach venenoso do suíço.

O ponto que define o iguais em seu próximo game de serviço é um resumo da desconcentração de Federer. Na tentativa de drop shot, sua bola sequer chega à rede. Grotesco. Em mais um erro, a oportunidade de break para Nadal, salva por Federer. É a primeira chance de break não concretizada por Nadal no jogo.

Depois de conquistar mais uma chance de break, vem um dos pontos mais sensacionais, com a quebra concretizada em uma passada do fundo de quadra, executada de forma magistral por Nadal. 5-1.
Nadal saca para jogo e tem de enfrentar um 0-40. Federer quebra. Um sopro de esperança para Federer?

Ele confirma seu serviço no game seguinte. 5-3. Nadal, mais uma vez, irá sacar para o jogo. Para o 7º título em Roma. Com 2 erros não forçados de Roger, Nadal abre 30-0. Mais uma madeirada de Federer, que está se tornando habitual, e Nadal chega ao match point. E não o perde. Nadal campeão em uma hora e nove minutos. Uma surra morna e básica que culminou em sua vigésima vitória contra Federer (e apenas 10 derrotas) e no sexto torneio ganho no ano (terceiro consecutivo).

Importante destacar que dos 59 pontos vencidos por Nadal no jogo, nada menos que 32 foram frutos de erros não forçados de Federer, o que resume o quão apática foi a atuação do suíço. Apenas para ilustrar, dos 36 pontos conquistados por Federer, apenas 8 foram atribuídos de graça por Nadal. Que imensa diferença daquela mesma final de Roma de 2006, que terminou apenas no quinto set com vitória de Nadal.

Nadal vibra como se tivesse vencido um jogo de exibição. Os jogos que realmente valeram pra ele neste torneio foram contra David Ferrer e Ernest Gulbis. E ontem teríamos uma verdadeira final, caso Djokovic tivesse passado por Berdych.

Hoje esse confronto – Nadal x Federer- não tem mais muita graça, infelizmente. Roger já não tem a ambição de ser superior a Nadal, ainda mais na terra batida do saibro, onde Nadal é o maior jogador de todos os tempos. Muito mais combativo é o confronto entre Nadal x Djokovic, o qual, embora haja vantagens também para Nadal (19 vitórias contra 15 derrotas), propiciam jogos muito mais interessantes.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

A Humilhação - Philip Roth

"A Humilhação " é apenas o segundo livro de Philip Roth que li, confesso - o primeiro fora "O Avesso da Vida" - mas já me sinto totalmente fascinado pela sua literatura cheia de armas de grande impacto, que nos arremata com seu imenso sarcasmo, ironia e humor, sempre dosado com sexualidade e o vocabulário "pesado", mas de fácil compreensão.

A dor e a angústia da passagem do tempo, aliada à decadência física e mental do personagem, dá o tom do livro, que, embora curto (pouco mais de 100 páginas), nos vislumbra com ataques diretos de digressão, utilizando-se das dicotomias "depressão e felicidade", "otimismo e pessimismo", "prazer e impotência", "vida e morte". E Roth sabe lidar com todas essas mudanças de foco como poucos, dado seu amplo domínio da escrita literária.

O livro começa ecoando as palavras de Próspero, em “A Tempestade”: 

“Findou nossa função. Esses atores, / Tal como eu vos dissera, eram espíritos / Que agora somem sem deixar vestígio.” 

O protagonista, o famoso ator Simon Axler fracassara, justamente no papel de Próspero (e também no de MacBeth) e agora se via incapaz de subir ao palco, “preso no papel do homem que foi privado de si próprio, de seu talento, de seu lugar no mundo, um homem abjeto que não passava do somatório de seus defeitos”.

Ele que atuava por instinto, sem tantas regras e condições, agora, aos 65 anos, pensava demais, havia perdido a espontaneidade. Passa a interpretar com esforço sofrido, o que transparecia para o público. Desiste. Fecha-se por um tempo numa clínica psiquiátrica para não cair na tentação do suicídio. Ao sair, refugia-se numa casa de campo, onde passa o tempo sem fazer absolutamente nada, em quase negação da vida. Até que surge a filha de um velho casal de amigos, “uma combinação mágica de xamã, acrobata e animal” que lhe devolve o ânimo perdido. Saindo de uma longa relação lésbica, ela, 25 anos mais nova, o seduz completamente, fazendo com que se entregue ao novo papel de amante. Isso sem antes ter contato com alguém que mudaria muito sua vida - e a dela própria e de muitas outras pessoas.

Pegeen, a filha do casal de amigos, atravessa uma jornada de redescoberta. Por mais que tenha mais de 40 anos, suas opções ainda não estão muito bem estabelecidas. Aberta assim está às mais variadas experiências - inclusive a de voltar a ser heterossexual.

Axler, então, diante de sua possível salvação, trata de tornar sua amada mais feminina, comprando-lhe roupas e moldando suas atitudes. Com candura de adolescente, tenta convencer os pais, atores frustrados e talvez invejosos de seu sucesso, de que tem as melhores intenções. Porém, a ruína está a apenas alguns passos. Talvez sempre esteve onipresente. Uma jornada sexual tem início e, assim, parece que tudo está cada vez mais próximo do fim.

Ao fim, o que fica é o poético vazio da vida. Quando não temos mais no que nos apoiar e nos sustentar, o que acontece? Talvez sejam questionamentos que o próprio Roth, com quase 80 anos, se faça ao escrever seus novos livros.