segunda-feira, 20 de maio de 2013

Os sabores do Palácio (Les saveurs du Palais)


O filme "Sabores do Palácio", dirigido por Christian Vincent, é baseado na história real da cozinheira do presidente francês François Mitterand, no Palais Elysee (Palácio do Governo). Hortense Laborie (Catherine Frot) é uma Chef pega de surpresa pelo convite para ser a cozinheira da principal comitiva do governo presidencial, após ter sido indicado por um famoso e renomado chef francês. Meio relutante, ela aceita o cargo.

A partir desse momento, uma série de omissões do roteiro enfraquecem a história do filme, haja vista que (i) poderia ter se dado uma importância mínima para a trajetória de Hortense antes do tão prestigiado convite, agregando, de certa forma, informações sobre o porquê de ter sido escolhida para a função, (ii) o roteiro poderia ter abordado a dificuldade que ela provavelmente teve com a utilização de todo um aparato tecnológico presente na cozinha que viria a trabalhar - considerando que, ao chegar ao seu posto no primeiro dia, desconhecia a maioria dos equipamentos lá presentes e sua forma de utilização, e (iii) ter utilizado uma história paralela, na qual a protagonista se encontra na Antártida, como Chef de cozinha da equipe francesa de pesquisadores lá presente.
Principalmente em virtude da escolha da história paralela, a história principal acaba perdendo em importância, profundidade e relevância, aliado ao fato da atriz Catherine Frot não demonstrar o carisma necessário para ensejar tanta adoração por onde passa - com exceção dos que trabalham na cozinha "secundária" do Palais Elysee, que a odeiam/invejam com voracidade.

Assim, e aliado ao fato da protagonista não dividir seu protagonismo no longa com os "sabores" do palácio, o filme se torna enfadonho e desinteressante em diversos momentos, salvo apenas quando contamos com a presença ilustre da comida originária da rica culinária francesa. Entretanto, a demonstração da burocracia presente no palácio - com o controle rígido de tudo o que se é feito -, além de todo o estresse que tal ofício (de Chef) origina, é um ponto positivo isolado, o qual, porém, não salva o filme.

domingo, 19 de maio de 2013

O 30º capítulo de Nadal x Federer



Final do Masters 1000 de Roma. Por ser a trigésima partida entre esses dois ícones do esporte – Roger Federer e Rafael Nadal, vale reportar mais esse capítulo na história do confronto de jogadores tão espetaculares. Entretanto, as estatísticas não sugerem um confronto parelho. Isso pois no saibro, contabilizam-se 12 vitórias para Nadal e 2 apenas para Federer. No geral, são 19 vitórias para Nadal e 10 para Federer.

Nadal, com 26 anos e 55 título de simples, é atual número 5 do mundo – tecnicamente, vez possa ser considerado o primeiro, pois perdeu muitas posições em decorrência de seu afastamento do circuito para tratar de seus problemas crônicas no joelho. Tem 23 títulos de Masters 1000, sendo o maior ganhador de torneio. Só em Roma foram 6 campeonatos.

Federer, por sua vez, com 31 anos e 76 títulos de simples, é considerado o melhor tenista da história – sim, ele foi, mas não é mais. Faz sua primeira final do ano. Atual número 3 do mundo. Tem 21 títulos de Masters e nunca foi campeão em Roma, tendo feito 3 finais, uma, inclusive, épica, contra Nadal em 2006, tendo perdido apenas no quinto set, após ter desperdiçado dois match-points.

Roger até agora não perdeu nenhum set na competição e teve jogos mais fáceis que Nadal. Será que está “babando” mesmo por esse título?

Dia de muito sol em Roma. Quadra Central. Nadal e seus tiques irritantes (ajuste da cueca, do cabelo e do nariz). O ace de Federer no primeiro ponto e o voleio do segundo sugerem um domínio do suíço? Primeiro game do Federer, com a ótima sugestão do saque e voleio, o que facilita muito o jogo para o Federer. Trocar bolas de fundo de quadra é suicídio frente a Nadal. Para quem acompanhou todos os 29 jogos entre os 2, sabe que Federer só tem chances contra o espanhol quando encaixa bem o voleio e drop shots.

Após confirmar seu serviço, Nadal consegue a quebra do saque de Federer com extrema facilidade no game seguinte, contando com um erro não forçado no break point. Incrível, mas se fosse com qualquer outro jogador, Federer teria tido, provavelmente, uma outra atitude em um ponto tão importante.

No game de “confirmação da quebra”, quatro erros do Federer e confirmação do serviço do Nadal, o que demonstra incrível instabilidade mental do suíço. A rede é sua principal inimiga, às vezes. Sabe que suas bolas tem que ser baixas e rápidas para diminuir o tempo de reação de Nadal, mas sua ansiedade e afobação o atrapalham muito. E quando suas bolas não param na rede, acabam sendo fundas demais e saem da quadra. Falta uma dosagem correta.

Já Nadal é um muro de concreto. Por ele nada passa e seu emocional é o mais forte da história do tênis. Suas bolas fundas no revés (esquerda) de Federer são o veneno que há anos funciona contra o suíço, sem que ele encontre muitas respostas concretas.

4-1 Nadal. 21 minutos de jogo, duas quebras e um set praticamente decidido. Nesse momento, com o seu jogo habitual, não há como Federer ganhar o jogo. Nadal criou uma zona de conforto intransponível por Roger, que sequer força algo diferente. Continua com erros não forçados, enquanto Nadal aposta sempre em seus balões de fundo de quadra para desestabilizar e, então, encaminhar o winner na jogada seguinte.

5-1 Nadal. 30-30, mais um erro não forçado de Federer. Set Point para o Nadal. Federer aposta em um voleio pífio, que vai longe. 6-1 para o Nadal em 23 minutos apenas. Muito mais por medo e ansiedade do que por uma surra, Federer perde o set de forma vergonhosa.

Com 15 erros não forçados de Federer, ele deu ao Nadal praticamente dois terços dos pontos ganhos pelo espanhol. Federer não insistiu no saque e voleio que lhe valeu o seu único game na partida até agora e isso tem sido uma péssima escolha.

Segundo set. 0-30 Federer. Bons ataques lhe renderam uma expectativa que foi abortada com um voleio mal executado e um erro na devolução. 30 iguais. Com o segundo erro não forçado de Nadal no game, surge a primeira chance de quebra de Federer no jogo, revertida com um ótimo saque aberto de Nadal, que sabe se livrar dessas situações como ninguém. Roger alterna poucos winners espetaculares com muitos erros pífios. Isso rende o game para Nadal, que controla tudo do funda da quadra com amplo domínio.

Onde estariam os drop shots e os voleios de Federer para fazerem o adversário sair da sua zona de conforto? Não existem.

14-40 para Nadal. Diferentemente de Federer, Rafael agarra suas chances com tudo que possui. Quebra o saque com uma pancada firme, contabilizando mais uma passada sensacional. 2-0 Nadal e o jogo vai se encaminhando para o fim, em um jogo totalmente apático de Federer.

Nadal faz 3-0, ganhando seu game de zero e três erros não forçados de Federer. Não temos sequer 40 minutos de jogo ainda.

No game seguinte, Federer, nitidamente envergonhado, melhora seu jogo para tentar evitar um pneu (6-0). Após muito tentar, conseguiu um game como muito esforço. Até agora, entretanto, Nadal ganhou o dobro de pontos de Federer no jogo.

Nadal conseguiu abrir 4-1, mesmo tendo cometido uma dupla falta e ter visto um approach esquisito, porém eficiente, de Federer, que resultou em seu smash. Porém, na sua última oportunidade de confirmação antes do iguais, Nadal conseguiu um excelente ponto, mostrando seu antídoto para uma nova investida em approach venenoso do suíço.

O ponto que define o iguais em seu próximo game de serviço é um resumo da desconcentração de Federer. Na tentativa de drop shot, sua bola sequer chega à rede. Grotesco. Em mais um erro, a oportunidade de break para Nadal, salva por Federer. É a primeira chance de break não concretizada por Nadal no jogo.

Depois de conquistar mais uma chance de break, vem um dos pontos mais sensacionais, com a quebra concretizada em uma passada do fundo de quadra, executada de forma magistral por Nadal. 5-1.
Nadal saca para jogo e tem de enfrentar um 0-40. Federer quebra. Um sopro de esperança para Federer?

Ele confirma seu serviço no game seguinte. 5-3. Nadal, mais uma vez, irá sacar para o jogo. Para o 7º título em Roma. Com 2 erros não forçados de Roger, Nadal abre 30-0. Mais uma madeirada de Federer, que está se tornando habitual, e Nadal chega ao match point. E não o perde. Nadal campeão em uma hora e nove minutos. Uma surra morna e básica que culminou em sua vigésima vitória contra Federer (e apenas 10 derrotas) e no sexto torneio ganho no ano (terceiro consecutivo).

Importante destacar que dos 59 pontos vencidos por Nadal no jogo, nada menos que 32 foram frutos de erros não forçados de Federer, o que resume o quão apática foi a atuação do suíço. Apenas para ilustrar, dos 36 pontos conquistados por Federer, apenas 8 foram atribuídos de graça por Nadal. Que imensa diferença daquela mesma final de Roma de 2006, que terminou apenas no quinto set com vitória de Nadal.

Nadal vibra como se tivesse vencido um jogo de exibição. Os jogos que realmente valeram pra ele neste torneio foram contra David Ferrer e Ernest Gulbis. E ontem teríamos uma verdadeira final, caso Djokovic tivesse passado por Berdych.

Hoje esse confronto – Nadal x Federer- não tem mais muita graça, infelizmente. Roger já não tem a ambição de ser superior a Nadal, ainda mais na terra batida do saibro, onde Nadal é o maior jogador de todos os tempos. Muito mais combativo é o confronto entre Nadal x Djokovic, o qual, embora haja vantagens também para Nadal (19 vitórias contra 15 derrotas), propiciam jogos muito mais interessantes.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

A Humilhação - Philip Roth

"A Humilhação " é apenas o segundo livro de Philip Roth que li, confesso - o primeiro fora "O Avesso da Vida" - mas já me sinto totalmente fascinado pela sua literatura cheia de armas de grande impacto, que nos arremata com seu imenso sarcasmo, ironia e humor, sempre dosado com sexualidade e o vocabulário "pesado", mas de fácil compreensão.

A dor e a angústia da passagem do tempo, aliada à decadência física e mental do personagem, dá o tom do livro, que, embora curto (pouco mais de 100 páginas), nos vislumbra com ataques diretos de digressão, utilizando-se das dicotomias "depressão e felicidade", "otimismo e pessimismo", "prazer e impotência", "vida e morte". E Roth sabe lidar com todas essas mudanças de foco como poucos, dado seu amplo domínio da escrita literária.

O livro começa ecoando as palavras de Próspero, em “A Tempestade”: 

“Findou nossa função. Esses atores, / Tal como eu vos dissera, eram espíritos / Que agora somem sem deixar vestígio.” 

O protagonista, o famoso ator Simon Axler fracassara, justamente no papel de Próspero (e também no de MacBeth) e agora se via incapaz de subir ao palco, “preso no papel do homem que foi privado de si próprio, de seu talento, de seu lugar no mundo, um homem abjeto que não passava do somatório de seus defeitos”.

Ele que atuava por instinto, sem tantas regras e condições, agora, aos 65 anos, pensava demais, havia perdido a espontaneidade. Passa a interpretar com esforço sofrido, o que transparecia para o público. Desiste. Fecha-se por um tempo numa clínica psiquiátrica para não cair na tentação do suicídio. Ao sair, refugia-se numa casa de campo, onde passa o tempo sem fazer absolutamente nada, em quase negação da vida. Até que surge a filha de um velho casal de amigos, “uma combinação mágica de xamã, acrobata e animal” que lhe devolve o ânimo perdido. Saindo de uma longa relação lésbica, ela, 25 anos mais nova, o seduz completamente, fazendo com que se entregue ao novo papel de amante. Isso sem antes ter contato com alguém que mudaria muito sua vida - e a dela própria e de muitas outras pessoas.

Pegeen, a filha do casal de amigos, atravessa uma jornada de redescoberta. Por mais que tenha mais de 40 anos, suas opções ainda não estão muito bem estabelecidas. Aberta assim está às mais variadas experiências - inclusive a de voltar a ser heterossexual.

Axler, então, diante de sua possível salvação, trata de tornar sua amada mais feminina, comprando-lhe roupas e moldando suas atitudes. Com candura de adolescente, tenta convencer os pais, atores frustrados e talvez invejosos de seu sucesso, de que tem as melhores intenções. Porém, a ruína está a apenas alguns passos. Talvez sempre esteve onipresente. Uma jornada sexual tem início e, assim, parece que tudo está cada vez mais próximo do fim.

Ao fim, o que fica é o poético vazio da vida. Quando não temos mais no que nos apoiar e nos sustentar, o que acontece? Talvez sejam questionamentos que o próprio Roth, com quase 80 anos, se faça ao escrever seus novos livros.

terça-feira, 14 de maio de 2013

Os impactos de Elena

Quem é Elena? A pergunta que ecoou nas redes sociais foi utilizada como marketing para promoção do filme recém lançado em São Paulo. Wagner Moura, Julian Lemmertz, dentre outros, nos perguntaram e a resposta, após assistir ao longa, é “não sei o bastante”, ao contrário sobre sua irmã, Petra Costa, diretora do filme, a quem acabamos sabemos muito mais do que Elena. Entretanto, saber sobre Petra é obter vestígios sobre quem fora Elena.

O motivo da realização do filme, podemos dizer, é a tentativa de descoberta. Tenta-se descobrir quem é Elena, destrinchando um pouco de sua infância, adolescência e o período de angústia vivido em Nova York, após tentativas não muito bem sucedidas de se tornar uma grande atriz e a culminação no suicídio aos vinte anos de idade. É claro que a tentativa de descoberta de uma pessoa antes tão próxima, que morreu há muito tempo – em 1990 -, acaba gerando uma jornada de autodescoberta.

Petra opta pela utilização de muita poesia, até por demais excessiva às vezes, seja através das palavras dialogadas por Petra, que, em muitos momentos, parecem mais sussurros quase inaudíveis (talvez por conta da qualidade do som da sala na qual assisti ao filme), seja através de belas imagens montadas de forma a refletir a angustia das protagonistas, além da trilha sonora melancólica e muito bem adaptada ao contexto da dor que ainda se perpetua, na medida em que o passado nebuloso vai sendo redescoberto através das cartas e vídeos, comprovando-se, de certa forma, que os mortos continuam vivendo através das lembranças.

Além de Petra e Elena, uma outra protagonista, a mãe delas, acaba optando por atuar em algumas situações, talvez por ter sonhado em ser atriz em sua juventude, fato que retira um pouco do caráter documental do longa. Mas, a que tipo de documentário exatamente assistimos? Com certeza, o mesmo não se vale das premissas convencionais, mas opta, ao contrário, não tanto por buscar respostas, mas sim o de ser intuitivo o bastante para nos deixar levar pelo ambiente quase onírico criado. E certamente há um grande mérito de Petra nisso. A bem da verdade, se Petra não busca respostas ou explicações, acabamos nós, espectadores, um pouco ávidos disso, principalmente com relação a algumas atitudes e omissões cometidas pelos pais.

De qualquer modo, tecnicamente falando, o longa, rodado com filme Super-8, uma câmera DSLR e um iPhone, tem imagens que deslumbram, aliadas a uma fotografia bem cuidada e planos bem montados. Tanto que recebeu muitos elogios – “uma das experiências mais agudas que já vivi no cinema” (Walter Salles) e “um filme que provoca 60 insights por minuto” (Fernando Meirelles) e prêmios no Festival de Brasília do ano passado, incluindo melhor documentário pelo júri popular, e menções especiais nos Festivais de Guadalajara e Zagreb.

Uma ótima e nova experiência, com certeza. Mas sem tanto exagero.