quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Bem amadas (Christophe Honoré) e o Novo Cinema Francês

Na semana passada, fui ao Reserva Cultural assistir, com a presença inseparável da minha namorada, o novo longa-metragem meio sort of musical do diretor francês Christophe Honoré, Bem amadas, que se acostumou a fazer filmes dessa maneira, variando a narrativa convencional pelo uso frequente desse musical não tão convencional, no qual os personagens cantam de forma despretensiosa - um cantar falado, por assim dizer, típico francês.

Antes de falar do filme, gostar de fazer uma breve introdução sobre Christophe Honoré, que faz parte da "nova velha" geração do cinema francês, que se não bebe tanto da Nouvelle Vague de Truffaut e Godard, bebe da Nouvelle Vague de Chabrol e Resnais, fazendo um cinema bem autoral, pois sabemos que um filme é de Honoré quando assistimos.

Algumas características de seus filmes são a temática por muitas vezes voltada para relações homossexuais, conflitos familiares e amorosos, intensidade da melancolia e utilização, em alguns filmes, da linguagem cantada.

Nascido em 1970, Christophe escreveu alguns artigos para a famosa Les Cahiers du Cinéma e  livros destinados a jovens adultos na década de 90. Escreveu duas peças de teatro e começou na direção em 2000, com o filme Nous deux. Com esse, já são onze filmes em sua curta carreira de sucesso. Particularmente, dentre esses onze filmes, destaco: Em paris, Canções de Amor, A Bela Junie, Não minha filha, você não vai dançar e o atual Bem Amadas, todos com a participação de Louis Garrel, com quem firmou essa fiel parceria.

Vale dizer que essa nova geração do cinema francês também conta com outros nomes de peso: Cédrik Klapisch, que dirigiu Albergue Espanhol, Bonecas Russas e Paris, seus trabalhos mais reconhecidos. E se Honoré tem sua parceria com Louis Garrel, Klapisch tem a sua com outro grande ator francês da atualidade, Romain Duris. François Ozon, contemporâneo de Honoré e Klapisch, também produz um belo cinema, com alguns filmes muito bons, tais como Oito Mulheres, Swimming Pool, O Tempo que Resta, Angel, O refúgio e Potiche. 

Voltando a Bem-Amadas, o seu começo com "These boots are made for walking", onde mulheres experimentam os mais variados pares de sapatos, empolga. Estamos em Paris, na década de 1960, acompanhando Madeleine (Ludivine Sagnier, de Uma Garota Dividida em Dois, de Claude Chabrol), vendedora da loja de sapatos da cena inicial, que se torna prostituta ocasionalmente (prostitui-se para comprar seus sapatos e para não roubar), até ser resgatada por um médico tcheco, Jaromil (Radivoje Bukvic), com quem tem uma filha e se muda para a cidade de Praga. 

Porém, não consegue ficar muitos anos lá: a infidelidade do marido se une aos problemas políticos que se passava na então Tchecoslováquia, no evento histórico conhecido como Primavera de Praga, período de liberalização política do país durante a época de sua dominação pela União Soviética após a Segunda Guerra Mundial. Esse período começou em 5 de Janeiro de 1968, quando o reformista eslovaco Alexander Dubček chegou ao poder, e durou até o dia 21 de Agosto quando a União Soviética e os membros do Pacto de Varsóvia invadiram o país para interromper as reformas.

É de se ressaltar que a direção de arte, figurino e cores são muito bem elaborados para a criação de um passado remoto e para a fidelização ao tempo histórico que Honoré busca retratar. Tudo é tratado com minúcia pra nos deixar vivenciar o passado.

O passado e o presente fazem um diálogo na figura de Madeleine (na maturidade interpretada por Catherine Deneuve) e sua filha, Vera (Chiara Mastroianni, filha da atriz com Marcello Mastroianni). Ela busca um amor além do amor que sente/sentiu por Clément (Louis Garrel), e o seu recente envolvimento é com Henderson (Paul Schneider), músico norte-americano gay. Clemént, por sua vez, nunca escondeu que seu amor continua e, por isso, ainda sofre por não conseguir alcançar Vera.

Todo o amor, sua ausência, o sofrimento e alegria são pontos que culminam na expressividade musical de seus personagens. Cantando, talvez, você expressa sentimentos que não se desenvolvem no diálogo convencional. Mas, ao mesmo tempo que entendemos a sua utilização, parece-me que Honoré, em Bem Amadas, exagera ao concentrar as encenações musicais em alguns momentos do filme, o que pode cansar. Se fossem tratadas de forma homogênea durante toda a projeção, talvez não fosse um problema.

Seguindo, o pai de Vera volta para França, agora interpretado pelo cineasta tcheco Milos Forman (diretor de Amadeus e Um estranho no ninho), e novamente quer ser amante de sua ex-mulher que, mesmo casada com François (Michel Delpech), não resiste e se entrega, mas não abre mão de seu casamento. É um círculo vicioso a que estes personagens se submetem. Mas isso, não obstante, traz clichês franceses à tona - de que são promíscuos, libertinos, poligâmicos, etc, o que se intensifica no avanço da relação entre Vera e Henderson, onde, aliado a isso, a consciência e o bom-senso se deixam levar pela loucura e pelo egoísmo.

Trafegando entre momentos históricos - Primavera de Praga e pós 11.09 - o longa é uma história sobre o amor, o "desamor" e suas consequências, além de ser uma espécie de antítese ao título do filme. Mas até mesmo pela pluralidade de personagens, nenhum é muito profundamente trabalhado, o que nos impede de ter uma relação mais direta com a trama. Não é um filme ruim, mas de meio termo, com suas regularidades e irregularidades.


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