Para Roma, com Amor, novo filme de Woody Allen, é inspirado no Decamerão, coleção de cem novelas escritas por Giovanni Boccaccio entre 1348 e 1353. A narrativa é composta por quatro histórias "paralelas" que envolvem traição e fama. O longa é repleto de referências e cópias de personagens e tramas presentes em longas não só de Allen, mas também do cineasta italiano Federico Fellini. O triângulo amoroso formado por Jack (Jesse Eisenberg), Sally (Greta Gerwig) e Monica, uma dita femme fatale (mas interpretada por Ellen Page, convenhamos que não é muito plausível) é interferido por John (Alec Baldwin) - que atua como a subconsciência de Jack, ou apenas um espectro, ou seria Jesse a versão juvenil de John? -, prevendo o envolvimento do jovem com a amiga de sua namorada Sally.
Aqui fica tudo muito parecido com Igual a Tudo na Vida, pois os personagens de Eisenberg e Page são similares ao casal Jerry (Jason Biggs) e Amanda (Cristina Ricci). Ele, um jovem com suas aflições e inseguranças; ela, uma jovem atriz vulnerável, tempestuosa e incontrolável.
Outra trama envolve um casal recém casado do interior, que chega na cidade para tentar se estabelecer; a história é cópia adaptada do filme O Abismo de um Sonho, de Fellini. As semelhanças nas tramas e nos personagens são muito perceptíveis. A traição na obra de Allen é mais incisiva que no original de Fellini, com interferência da oscarizada Penélope Cruz, como Anna. Infelizmente, os personagens de Cruz e Baldwin, mesmo tendo um papel importante em seus segmentos, não têm finalizações, ficando perdidos na ação. Baldwin, por exemplo, inicia o filme em uma mesa com sua mulher e amigos, e depois se limita a ser um personagem "sombra" na história entre Jack, Sally e Monica. Por outro lado, mesmo estando muito bem, não entendo o porquê de se escolher uma atriz espanhola - Cruz - para interpretar uma mulher italiana, se poderia ser aproveitada a ocasião pra se escolher uma atriz italiana para o papel - Monica Belucci, talvez.
O italiano Benigni faz sua participação em um segmento, que tem como tema a fama súbita. O desenrolar de sua história é a que mais se aproxima do universo do diretor. Trata-se de um homem normal que da noite para o dia vira celebridade. Esta narrativa é uma crítica às convenções de consumo e das celebridades instantâneas que não tem nada a dizer nem um talento considerável para a fama. E em contraponto a esta história, um casal e suas famílias: de um lado a turista americana Hayley (Pill) e de outro o italiano Michelangelo.
A família de Hayley é composta por um diretor fonográfico aposentado (Allen) e por uma psiquiatra niilista (Davis). Já os pais do noivo são um casal simples, tendo o pai um talento nunca explorado. Os diálogos e circunstâncias desta parte da narrativa são levados aos absurdos que só Woody é capaz de levar para as telas. Os conflitos e situações de extremos são típicas do diretor em todo o longa. Mas também é possível encontrar muitos diálogos, frases e ações já visitadas por ele. Seu alter ego (sempre presente em seus filmes), incorpora os demais personagens.
A falta de relação entre os segmentos acaba deixando o filme bem chato de se acompanhar depois de algum tempo. As histórias, em tese, deveriam se passar no mesmo espaço de tempo, mas enquanto a história do casal italiano se passa em um longuíssimo dia, os segmentos dos personagens de Benigni, Eisenberg, Page, Allen e Baldwin se passam em alguns dias, talvez semanas. Essa falta de sincronia no tempo nos afasta ainda mais do desenvolvimento das narrativas.
Além disso, se o título do filme nos remete a uma homenagem a Roma, tal como fora feito em Meia-noite em Paris, essa homenagem contempla críticas - vide a da criação de celebridades pela mídia, apenas para ter o que falar, assim como acontece em BBBs e congêneros - que não sabemos se a intenção é remetá-las tão somente para Roma e seus habitantes ou se de uma forma geral.
Depois de seis anos sem atuar em seus filmes - a última vez foi em Scoop - o seu retorno foi infeliz. Nesse curto espaço de tempo ele fez filmes muitos bons (Vicky, Cristina, Barcelona e Meia-noite em Paris), em que as cidades-personagens ganharam homenagens muito especiais.
Mas isso não se repete em Para Roma, com Amor, que, diante da filmografia de Woody Allen, é muito irregular, pra não dizer ruim.
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